quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A epidemia da indiferença

Tem se tornado lugar comum no noticiário a ação de um bando de meninas pobres, que invadem lojas, furtam bijuterias, batons e cosméticos e saem em correria pelas calçadas de bairros de classe média de São Paulo.
A polícia é acionada e leva as meninas para a delegacia. As mães são convocadas. Chegam os canais de televisão. E o circo está montado. Ali, diante das câmeras se estabelecem as motivações que teriam levado as meninas ao crime. E suas mães, devidamente expostas, são julgadas e condenadas sumariamente como responsáveis pela ação das filhas.
Fim do noticiário e todos, aparentemente, satisfeitos por terem visto as meninas serem apreendidas e condenado suas mães, apresentadas como irresponsáveis, voltam as atenções para o próximo capítulo da novela. E a vida continua. Até, claro, que outro incidente venha a acontecer.
Porque as meninas são vítimas e não criminosas. São crianças abandonadas, filhas de mães que foram social e economicamente deixadas à própria sorte. E por mais cinismo que o noticiário sensacionalista tente nos induzir, lá no fundo de nossas almas cidadãs a gente sabe que tem alguma responsabilidade neste abandono sistemático e continuado dessas crianças.
Somos, no mínimo cúmplices, por contribuir com nosso aplauso silencioso com a epidemia de indiferença social que compromete os destinos de nossos meninos e meninas. Mesmo que concluamos que não temos nada a ver com essa situação, pois os meninos e meninas mostrados na televisão não são nossos filhos ou sobrinhos.
Se somos tão indiferentes com a sorte de crianças e suas mães pobres e abandonadas, o que dizer dos problemas que afetam os moradores de cortiço, o martírio dos sem teto que moram nas ruas, faça frio ou faça sol?
Ainda bem que a cura para a indiferença social está em nós mesmos. De tanto contarem com nossa cumplicidade na condenação das mães e suas filhas abandonadas, de tanto terem a certeza que apoiamos o abandono que o Estado condena seus jovens infratores, vamos, acredito, acordar para a realidade e ver que a epidemia da indiferença é um mal social a ser evitado.
Precisamos acordar para a solidariedade cidadã. E antes de nos deliciarmos com o espetáculo macabro de mães e filhas pobres e abandonadas sendo expostas ao escárnio público, vamos exigir dos prefeitos e vereadores de nossas cidades uma atitude a favor dos cidadãos que tiveram a infelicidade de perder tudo: emprego, renda, casas e dignidade.
Quem sabe chegará um dia em que nós, cidadãos e trabalhadores, não aceitaremos mais ser cúmplices dos macabros espetáculos de tevê. Vamos nos vacinar contra a epidemia da indiferença e exigir que os agentes do Estado sejam mais atuantes. Pois, afinal, é para isso que recolhemos nossos impostos e os escolhemos para nos representar.
Cícero Martinha, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e Mauá

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